sexta-feira, 30 de maio de 2008

A Sala De Espera

“8:00: Cadeiras rodeadas pelo bege das paredes – aquela tentativa tosca de transmitir pela influência psicológica das cores calma e passividade. Típica sala de espera, recheada por corpos inanes e rostos inexpressivos, onde o ar só tem um cheiro: paciência destilada.A TV fala muda.”.

A sala de espera está em todos os lugares; usualmente no banco ou na consulta médica, indiretamente na hora do almoço ou no encontro do cinema, explicitamente no ponto de ônibus e no dia da “grande festa”.A sala de espera é um relógio.

“10:45: As pernas estão imutáveis, uma sobre a outra. Frígidas. Supersaturação do ponto de estupor. No meio da enfermidade, da decrepitude surge hálito novo, dez anos. Um metro e meio de peraltice entre o pai e a mãe”.

A sala de espera não tem faixas etárias, muito menos censura. Ela se inicia na semente da vida serpenteando toda a sua inconstante estrutura.Criando, então, uma dúvida: “será que vivemos esperando?”.Esperamos nove meses para nascer, dias para brincar no jardim – quando pára de chover-, esperamos os pais nos buscar no futebol; na puberdade esperamos a inocência do primeiro beijo, a intensidade da primeira transa, esperamos ser os primeiros. Ansiedade nos percorre ao esperar o amor arrebatador, aquela nos fará beber Vinícius e respirar ultra-romantismo.Chegaremos a ponto de esperar a mulher certa, aquela a quem dizer: “amo-te por toda eternidade” e selar a utópica fidelidade com um beijo matrimonial. E, depois de todos os percursos da vida serem completados permaneceremos naquela velha cadeira de balanço esperando o pôr-do-sol de nossas vidas.

“11:00 : O pequeno se distrái de todo aquele tédio com o seu infinito campo imagético. De um salto se encolhe atrás das cadeiras – suas barreiras contra os ataques do “aliens”-,no outro, marcha como um soldado , ou então, se acolhe no peito da maternidade tépida.Mas ele, ainda está lá.Esperando a vez dos pais para poder,então,fugir para casa e ver os desenhos animados da Globo.Ele ainda está lá, esperando ,mas o que ele faz? Vive.”

Apesar de todos os momentos de insegurança e expectativa,que passamos naquelas eternas salas beges, brancas e azuis.Nós não estamos esperando vegetalmente tudo passar na frente de nossos olhos como um filme em 3-D.Nós somos aquele menino.Nós esperamos vivendo. Transformamos nossa vida a cada segundo de suposta espera,pois naquele momento eu peguei uma revista ou atendi o telefone,ou pensei em toda a filosofia que aqui está escrita, e impedi a esterilidade.Naquela espera da infância para a idade adulta eu acumulei lembranças e saudades das vivências do presente.A espera foi uma conseqüência.E assim como todas as coisas da incerteza vital.A sala de espera é apenas uma fase de transição.Nós vivemos o passado, o presente e o futuro. Nós esperamos vivendo e não vivemos esperando.

“11:15: Os olhos se deslocam por toda a sala. Ela ainda é impecavelmente bege, tentando, impotentemente me deixar calma. Senha 99. É a minha. Meus pés exangues pisam no chão na tentativa de continuar o caminho que há horas atrás parecia tão longo. Deixo para trás somente uma cadeira de plástico com a minha temperatura corporal e resquícios do perfume barato.Deixo para trás que eu fui há um segundo. ”

2 comentários:

Anônimo disse...

Adorei a sala de espera. Meu Deus, seus textos estão cada vez melhores. Vou adicionar o blog em Meus Favoritos.

Gustavo Santiago disse...

Esse é teu texto mais bem escrito.